Tema. Formação dos/as educadores/as da infância em contextos de (pós) pandemia. Uma oportunidade para o seu fortalecimento

““Porque a carreira de pedagogo, mais do que estudar uma profissão é preparar para uma MISSÃO”1 .
Luis Guastavino Córdova.

Contextualização
Como sociedade e certamente como profissionais dedicados à educação, enfrentamos uma das maiores crises pandêmicas da história, o que para muitos constitui um ponto de inflexão em relação a como são compreendidas e valorizadas as dinâmicas que norteiam as relações sociais, políticas, educativas, afetivas e educativas, valorizadas a nível global. Isso é observado com especial atenção no campo da educação onde devem ser projetadas mudanças essenciais que contribuam para superar as limitações de uma sociedade desgastada e desigual desde antes da pandemia e apostar em aspectos de comunicação para além das ferramentas virtuais para focar efetivamente em um ambiente mais relacional na forma de comunicação (Reimers & Schleicher, 2020).

As análises educacionais pós-pandemia – que esperamos acessar em breve -certamente partirão de uma premissa compartilhada e verdadeira: a crise da saúde foi uma tremenda oportunidade para o sistema educacional e seus atores. De fato, é indiscutível que esses anos foram de valiosas aprendizagens de todos os tipos- que desafiam sistemas, lideranças educacionais e comunidades.

Nesse cenário de aprendizado e desafios, a formação universitária também tem sido destacada e demandada. Desde antes da pandemia, observava-se a necessidade de repensar a formação de profesores/as. Por exemplo, a questão das mudanças nos processos de aprendizagem e seus aspectos contextuais já vinha sendo levantada como uma questão que precisava ser abordada no âmbito de um sistema educacional altamente segregado e excludente (UNESCO, 2020), com evidentes e profundas brechas digitais ( CEPAL-UNESCO 2020; González, et al., 2021).

As carreiras universitárias têm tido que aderir a padrões de qualidade estabelecidos, sem muita margem para propor programas de formação mais situados na realidade profissional e em coerência com os projetos de missão institucional, tendo também em conta as condições de admissão dos seus estudantes, entre outros desafios (UNESCO-IESALC, 2020).

É interessante, neste quadro de análise, repensar o foco de atenção que se promove na formação dos/das educadores/as da infância, dado o seu próprio carácter formativo – situado na educação infantil – que, pelo seu carácter basal na pirâmide educativa e pela sua reconhecida contribuição para a construção da cidadania, é fundamental para reivindicar um país mais educado em seu sentido amplo.

Parece que os discursos dos gestores de políticas públicas no campo da formação docente são permeados por frases que, embora absolutamente relevantes e compreensíveis, estão associadas a slogans de boas intenções. Assim, dar atenção às crianças que são educadas no nível inicial do sistema tornou-se uma proclamação que ninguém pode ignorar e deixar de compartilhar. Além disso, espera-se calibrar qualquer política ou estratégia educacional a partir dessa perspectiva. Acontece, porém, que essa ligação nem sempre é literal e eficaz. Com isso, queremos precisar que qualquer discussão que pretenda redefinir a formação profissional para esse nível educacional, deve caminhar para um efetivo enfoque nas características e necessidades educacionais da faixa etária com a qual o educador especializado se relaciona. Isso deve partir de uma noção básica, pactuada e articulada com todos os atores envolvidos, o que significa ter clareza sobre a sociedade que se quer construir e como a educação contribui para ela, fundamentando as transformações demandadas.

Jardim de Infância Colmenita da Universidade de Playa Ancha, Chile

Aspectos nucleares da formação inicial dos/das educadores/as da educação infantil
Como foi proposto, atualmente é necessário avançar para definições mais substanciais que permitam atender efetivamente aos requisitos para a formação de profissionais especializados em educação infantil que tenha como base e foco as necessidades das crianças que participam desse nível educacional. Neste quadro, será analisada a situação atual da formação de educadores/as que atuam na educação infantil no cenário atual e, a seguir, serão projetadas algumas iniciativas que possam superar os nós críticos atuais.

a. Situação atual da formação dos/das educadores/as da educação infantil
Um dos aspectos diferenciadores da formação de profissionais para o nível educacional tem sido tradicionalmente a formação prática precoce. As evidências da literatura indicam que a prática situada desde os primeiros anos da formação universitária favorece o aprendizado e a aproximação com o papel profissional e permite a reflexão para atender a propostas de intervenções pedagógicas efetivas (Parra, et al., 2021).

Dada a atual situação de saúde global, grande parte da formação prática tem sido realizada online ou remotamente com poucos espaços presenciais, limitados pela capacidade de ocupação (CEPAL-UNESCO, 2020). Reconhecendo que as instituições formadoras responderam prontamente às necessidades que surgiram na formação em condições de pandemia, a modalidade de trabalho das práticas à distância não corresponde aos vínculos efetivos e afetivos típicos das metodologias que caracterizam o modelo formativo desse nível educacional. Assim, os tutoriais voltados para bebês e crianças ou os materiais desenhados precisam ser avaliados quanto ao seu impacto na relação pedagógica dialógica que favorece o aprendizado dos bebês e crianças.

Isso tem impedido que o currículo de formação universitária se articule com o sistema de educação infantil e seus atores, o que limita a aproximação precoce com a profissão, o conhecimento real do nível e principalmente dos bebês, das crianças pequenas e a dinâmica de suas aprendizagens e contextos.

Então, a forma de compreender a aprendizagem, tanto no currículo de formação universitária quanto na rede de educação infantil, baseia-se em aspectos comunicativos voltados preferencialmente para a perspectiva vigotskiana, dado seu caráter distintivo ao vincular os contextos socioculturais em que ocorrem as interações e aprendizagem (Villalta e Assael, 2018). As experiências formativas neste sentido têm sido limitadas pelo ensino à distância que não permite maiores interações para evidenciar os aspetos comunicativos que caracterizam as atividades de aprendizagem que se promovem a este nível.

As adaptações pedagógicas que têm sido geridas desde o ensino universitário têm sido essenciais para responder à crise, mas há que ter cautela e melhor domínio técnico para não transferir uma modalidade de ensino presencial para um ambiente de ensino à distância. Em geral, uma abordagem restritiva é adotada para atender às necessidades de ensino à distância, sem integrar outros canais (rádio, televisão, celular, etc.). A experiência tem mostrado as enormes desigualdades de base no acesso às tecnologias de apoio aos processos formativos do ensino superior universitário por parte dos estudantes.

De modo geral, embora não tenha sido declarada especificamente uma priorização curricular no contexto da formação universitária, observam-se ajustes ou adaptações em termos de conhecimentos ou habilidades, conteúdos e ênfases, sem destacar o que é importante

São reconhecidos e valorizados os contributos formativos, metodológicos e avaliativos implementados para dar resposta às exigências da educação em plena pandemia, mas as limitações impostas pelas formas de interação educativa em condição remota não têm permitido o desenvolvimento de experiências formativas mais situadas para desenvolver competências profissionais associadas à didática integrada da formação profissional, nem demonstrar a necessária formação prática teórica exigida aos/às profissionais da área. Nesse sentido, surgem questões sobre como os/as universitários/as têm adquirido conhecimentos e habilidades relacionadas ao ensino, aprendizagem, disciplina, avaliação, desenvolvimento integral de bebês, trabalho com família e comunidades, investigação situada, gestão de emoções, desenvolvimento profissional, entre outras questões que surgem.

Jardim de Infância Colmenita da
Universidade de Playa Ancha, Chile

b. Algumas projeções para a formação dos/das educadores/as da educação infantil
O contexto em que se desenvolveu a formação profissional de educadores em todo o mundo tem sido marcado por uma pedagogia ‘pandêmica’ (https://www.psicoperspectivas.cl/index.php/psicoperspectivas/article/view/2434/1535#B9), caracterizada por uma espécie de domesticação da educação que tem implicado outras formas de atender à aprendizagem, as relações e vínculos, práticas educativas e papéis profissionais (https://www.psicoperspectivas.cl/index.php/psicoperspectivas/article/view/2434/1535#B27).

No nível da educação universitária, a literatura mostra a busca por ações e estratégias pedagógicas que, embora tenham possibilitado o enfrentamento da emergência, principalmente no que diz respeito ao atendimento à interação social e ao desenvolvimento motivacional dos alunos, à inclusão e utilização das TICs (https://www.psicoperspectivas.cl/index.php/psicoperspectivas/article/view/2434/1535#B17), não garantem com muita certeza a qualidade da formação dos/das profissionais docentes da infância. Por isso, há a necessidade de considerar aspectos específicos para reverter esse quadro preocupante, não só para a formação profissional na universidade, mas também para o sistema de educação infantil em uma perspectiva integradora e contextualizada, conforme expresso a seguir:

  • É imperativo repensar a formação dos profissionais da infância, gerando análises das realidades concretas do nível, seus atores e contextos, sistematizando experiências exitosas e nem tanto, sempre na perspectiva naturalista da educação infantil.
  • Projetar uma nova ênfase na formação profissional, onde o paradigma da educação para a vida e a construção da cidadania tenha um espaço importante. Temas como aprendizagem comunitária, justiça social, desenvolvimento sustentável, argumentação, autocuidado, autorregulação, emoções, entre outros que possam surgir, se articulem nos currículos de formação.
  • Retomar o caminho de uma educação entendida a partir de uma abordagem eminentemente social e de interação com os outros e seus contextos. A educação mediada pela virtualidade nos permitiu ter um espaço de interação que é necessário em tempos de pandemia, mas que deve ser revertido, principalmente se observado o caráter instrucional e educacional de grande parte das experiências realizadas neste período. Aspectos formativos como interação dialógica, participação e aprendizado entre pares e convivência comunitária devem ser projetados nos currículos educacionais de todo o sistema.
  • Adotar a proposta de currículos de formação profissional que se situem efetivamente nas condições e características dos bebês e crianças pequenas, que mais se aproximam da formação universitária nesta área. Especificar itinerários formativos que articulem processos práticos que ultrapassem a linha da prática e integrem várias disciplinas, abordagens e profissionais que pretendam uma formação verdadeiramente integral e inclusiva.
  • Incorporar temas de formação relacionados à gestão de adaptações pedagógicas mais efetivas, que não se limitem à priorização curricular, mas a visões situadas de aprendizagem, ampliando oportunidades de interação e comunicação.
  • Reafirmar a importância de contar com profissionais da área que valorizem espaços didáticos que promovam a aprendizagem a partir de uma abordagem diversificada.
  • Disponibilizar as lições aprendidas durante este tempo, que quebram os tempos de certezas para nos alertar sobre a ênfase atual na formação não apenas de profissionais, mas também na projeção nos sistemas em que eles irão interagir, bem como com os medos, desesperança, insegurança, mudanças e redefinições são aspectos de uma verdadeira e autêntica priorização.
  • Reencantar os/as estudantes das carreiras de pedagogia na área da educação infantil com a essência de uma formação profissional integral, dinâmica, ética e social e educacionalmente valorizada.

Es tiempo de poner a disposición los aprendizajes adquiridos en este tiempo, que derriban los tiempos de certidumbres para ponernos en alerta respecto a los actuales énfasis de la formación no solo de profesionales sino también de la proyección en los sistemas en que interactuarán, así los miedos, la desesperanza, la inseguridad, los cambios y las redefiniciones constituyen aspectos de una verdadera y autentica priorización.

Reencantar a los estudiantes de carreras de pedagogía en el área de la educación parvularia con la esencia de una formación profesional de carácter integral, dinámica, ética y valorada social y educativamente.

Considerações finais
Provavelmente o impacto da formação de educadores em condições de pandemia não é um tema acabado e do qual existem mais precedentes. Além disso, parece que vamos demorar um pouco mais para mensurar seus efeitos e real aprendizado, já que a natureza da pandemia continua mundial e a educação deve permanecer atenta para aprender e reorientar seus espaços e focos de atuação, em uma sociedade em constante dinamismo.

O desafio para os formadores de formadores não é menor. De fato, reconhece-se nos últimos anos um tempo complexo que mantém latente a genuína preocupação social e educativa de garantir uma formação profissional de qualidade e adequada aos contextos e exigências da sociedade e dos seus cidadãos. O exposto é relatado como um macro desafio, pois, por um lado, não está vinculado apenas à formação profissional universitária, mas principalmente à formação de estudantes da primeira infância.

Com isso, esperamos que os tempos de pandemia e os tempos de pós-pandemia convidem as comunidades universitárias e toda a sociedade a se questionarem sobre como enfrentar a missão educativa para além dos espaços terciários formais e se situarem realmente no papel social e transformador que lhe competem. Em seguida, especifiquem como os acadêmicos responsáveis ​​pela formação de educadores da infância ressignificarão sua tarefa a partir de um ensino e pesquisa mais relacional pertinente à profissão em contextos reais e diversos. Por fim, impõe-se pensar como será revitalizado o currículo formativo, posicionando-o como um dispositivo autêntico, efetivamente formador e transformador e sempre atento às necessidades contextuais, para além da padronização da formação tantas vezes observada nas trajetórias formativas universitárias.

Tradicionalmente, a preocupação central tem sido a formação prática dos educadores pré-escolares, aspecto destacado nos tempos atuais que têm sido afetados pelas poucas possibilidades de vivências formativas em contextos reais e próximos da realidade do nível educacional. Assim, é legítimo questionar como iremos suprir eventuais lacunas na formação daqueles/as estudantes que não têm conseguido manifestar as competências que os deveriam aproximar do exercício da sua futura profissão a partir de uma prática que os vincule à primeira infância. Com isto, coloca-se também a questão de como consolidar aspetos da profissão como o vocacional, a valorização da disciplina, o rigor e o empenho que isso implica.

Dra. Marcela Lara Catalán
Educadora da Infância e Mestre em avaliação educacional, Universidad de Playa Ancha. Doutora em Ciências da Educação Pontifícia Universidade Católica do Chile

Bibliografía
CEPAL/UNESCO (Comisión Económica para América Latina y el Caribe/Organización de las Naciones Unidas para la Educación, la Ciencia y la Cultura) (2020). La educación en tiempos de la pandemia de COVID-19, Informe COVID-19 CEPAL-UNESCO. Disponible [en línea] https://www.cepal.org/es/publicaciones/45904-la-educacion-tiempos-la-pandemia-covid-19
Dussel, I., Ferrante, P. y Pulfer, D. (2020). Pensar la educación en tiempos de pandemia: Entre la emergencia, el compromiso y la espera. UNIPE Editorial Universitaria.
González, M., Ladera, J., (https://dialnet.unirioja.es/servlet/autor?codigo=5288362) Mateo, C. y Quintanilla I. (2021). Educación, pandemia y brechas digitales. Participación educativa (https://dialnet.unirioja.es/servlet/revista?codigo=22856), ISSN-e 1866-5097, Vol. 8, Nº. 11, 2021 (https://dialnet.unirioja.es/ejemplar/578315), págs. 59-72
Khanna, R. y Kareem, J. (2021). Creating inclusive spaces in virtual classroom sessions during the COVID pandemic: an exploratory study of primary class teachers in India. International Journal of Educational Research Open, 2-2. https://doi.org/10.1016/j.ijedro.2021.100038
Lepp, L., Aaviku, T., Leijen, Ä., Pedaste, M. y Saks, K. (2021). Teaching during COVID-19: The decisions made in teaching. Education Sciences, 11(2). https://doi.org/10.3390/educsci11020047
Parra, L., Menjura, M., Pulgarín, L. y Gutiérrez, M. (2021). Las prácticas pedagógicas. Una oportunidad para innovar en la educación. Revista Latinoamericana de Estudios Educativos, 17(1), 70-94. https://doi.org/10.17151/rlee.2021.17.1.5
Reimers, F. y Schleicher, A. (2020). Schooling, disrupted schooling rethought: How the Covid 19 pandemic is changing education. OECD, abril 2020. Versión en español disponible en: https://globaled.gse.harvard.edu/files/geii/files/aprendiendo_durante_la_pandemia_v2-2.pdf
Salas, G., Santander, P., Precht, A., Scholten, H., Moretti, R., y López-López, W. (2020). COVID-19: impacto psicosocial en la escuela en Chile. Desigualdades y desafíos para Latinoamérica. Avances en Psicología Latinoamericana, 38(2), 1-17. https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.9404
UNESCO (2020). Informe de Seguimiento de la Educación en el Mundo 2020. Inclusión y educación: Todos sin Excepción https://2020educationreportconsultation.wordpress.com/
Villalta, M. y Assael, C. (2018). Contexto socioeconómico, práctica pedagógica y aprendizaje autónomo en el aula. Estudios Pedagógicos, 44(1), 49-68. https://doi.org/10.4067/S0718-07052018000100049

Notas
1. A tarefa número um do Chile: a transformação magistral do país” (2009), Professor Luis Guastavino Córdova. Acadêmico e ex-prefeito da Região de Valparaíso, Chile. Uma homenagem a quem dedicou grande parte da sua vida à educação, dos vários cenários onde teve de contribuir. Em particular, agradeço a sua valiosa gestão para a construção do jardim de infância e da escola pública que frequentei nos meus primeiros anos de escolaridade.
2. Para evitar sobrecarga gráfica, optamos por usar o masculino genérico ao longo do texto, no entendimento de que todas as menções em tal gênero sempre representam tudo e todos.

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